A
RESCISÃO DO CONCEITO ÉTICO-POLÍTICO EM AGNES HELLER[1]
ayrtonborgesmachado@yahoo.com.br
Brenda Caramês[3]
brendacarames@hotmail.com
Márvyn Kevin[4]
marvynkevin@yahoo.com.br
INTRODUÇÃO
Agnes Heller é uma das principais pesquisadoras da
filosofia contemporânea. Ao elaborar estudos com temas centrais, a teoria das
necessidades, com a moral, a história, o destino das esquerdas, a modernidade e
a pós-modernidade, os valores e a práxis. Heller é mulher, atenta às crises de
nossa época, que não tem medo de contestar.
No livro Além da
Justiça, o assunto a ser investigado, como ela menciona no prefácio do
livro, o próprio título abrange o tema a ser questionado como a ótica na qual
ele será discutido no decorrer dos capítulos, que é a Justiça. A autora faz uma
análise crítica sobre o conceito ético e político da justiça, tanto o tema como
a ótica na qual ele é discutido. Apesar de os capítulos terem sido condensados,
e um omitido, por causa da editora, eles ainda continuam com eixo central
inalterados, de acordo com a autora. A Obra está dividida em dois capítulos analíticos,
dois capítulos históricos e dois capítulos referentes à teoria normativa de
justiça.
A pesquisa será desenvolvida de acordo com o segundo
capítulo, O Conceito Ético Político de Justiça,
mas o ponto principal de nossa análise será o tópico A Dissolução do Conceito Ético-Político de Justiça. Entretanto, para
o melhor entendimento, primeiramente será feito uma pequena análise
introdutória sobre o primeiro capítulo da obra, O Conceito formal de Justiça, seguido de uma análise da transição
do antigo ao moderno acerca da justiça, pra que daí se possa adentrar mais
profundamente à nova condição da justiça na modernidade, tratando seus
paradoxos, a nova situação política e como o conceito ético-político de justiça
se comporta imerso nesse novo cenário.
1 O CONCEITO FORMAL DE JUSTIÇA
O senso de justiça não é geral, mas isso não significa sua ausência. De fato, são inúmeras tendências teóricas que propõem uma ótica para a melhor compreensão do termo justiça e seus aspectos. Desde a Antiguidade a justiça representou um ideal de uma prática perfeita do Direito, que acabou por se transformar em um problema, uma vez que se tornou um vazio conceitual na Modernidade. [5]
De acordo com Heller (1998), o conceito formal de
justiça implica em um nível muito além de abstração do que o conceito de “justiça
formal”. Nem todos os conceitos de justiça necessariamente implicam em um
conceito de justiça, isto é, a questão de justiça não pode ser direcionada somente
por uma regra determinada.
A autora refuta a ideia de uma justiça ligada
exclusivamente a um único padrão aplicável a toda situação. Portanto, atribui
uma nova redefinição para o conceito formal de justiça, sendo ele, uma
aplicação consistente e continua das mesmas normas e regras a cada um dos
membros de um agrupamento social aos quais elas se aplicam.
A noção do que é justo ou injusto é variável tanto como
o caráter humano, a principal dúvida são quanto à existência ou não de um
conceito contemporâneo de justiça, que acompanhe as mudanças éticas, sociais,
econômicas, políticas, na qual existe a consolidação de sociedade justa e
harmônica. Uma utopia para nossa realidade.[6]
2
A
CRISE CONCEITUAL NA TRANSIÇÃO DO ANTIGO AO MODERNO
A temática da justiça é
um dentre os primeiros assuntos a ser discutido pela antiguidade, portanto, pode
ser considerado como uma questão central que acompanha desde o nascimento da
filosofia, até os tempos atuais. De início, deixa-se claro nesta pesquisa que o
conceito ético-político sofre uma grande crise com a transição do tempo, isto
é, da Antiguidade à modernidade: “O novo conceito ético-político de justiça
termina, em vez de iniciar suas vicissitudes históricas, com a aposta moderna
retratada no Fausto, de Goethe” (HELLER,
1998, p.111-112).
No ritmo da transição
histórica, novos contextos, novos conceitos, novas correntes teóricas, entre
outras, ocasionaram mudanças de paradigmas[7], de
“pontos de partida” e premissas, a qual, no interesse que se tem de explicar
uma dada realidade, é impensável fechar os olhos para os novos conceitos e
aspirações que se vão ensejando. Portanto, as mudanças no político, no ético e
no conceito de justiça são substanciais.
Quanto aos paradigmas:
a felicidade está para a antiguidade, assim como a liberdade para a modernidade[8]. A
felicidade, na teleológica filosofia clássica, é o fim a ser realizado;
conciliando ao mesmo tempo simplicidade e segurança, o espírito desse conceito de Justiça é de certeza,
de um sentimento probo, ético. Se a filosofia antiga combateu veementemente a
relativização sofística da justiça, foi porque certamente acreditava-se na
justiça como um bem natural, uma
moralidade até certo ponto “absoluta” e guia da justiça, um verdadeiro conceito
ético-político de justiça.[9]
Uma vez que virtude está, para os antigos, próximo da justiça e da felicidade,
que para Aristóteles tem sentido ativo de ação, a justiça parece, assim como a
felicidade, ser um bem em si mesmo:
(...) chamamos
de absolutamente completa uma coisa
sempre eleita como uma finalidade e nunca como um meio. Ora, a felicidade,
acima de tudo o mais, parece ser absolutamente completa nesse sentido, uma vez
que sempre optamos por ela por ela mesma e jamais como meio para algo mais
(...). Mas ninguém opta pela felicidade pela honra, pelo prazer, etc., nem
tampouco como um meio para qualquer outra coisa que seja, salvo ela mesma
(ARISTÓTELES. 2007, p. 48)
Enquanto no Antigo o
conceito de justiça visa à felicidade, na modernidade, diz Agnes Heller (1998),
o paradigma é o paradoxo da liberdade, temática que será explicada mais
claramente no próximo tópico. A autora denuncia a modernidade como um dissolvente
do conceito ético-político de justiça, há muito construído (desde a filosofia
antiga). A justiça passa a ser
compreendida como esvaziada de seu conteúdo ético, o império da razão assume a função de “juiz” e dita nosso entendimento
sobre o bem e o mal. Nem todos os conceitos ético-políticos de justiça protegem
uma ordem sociopolítica, onde todas as normas são morais é considerado como uma
exceção e não a regra[10].
A modernidade relativiza também a moral, sendo
este outro fator para a crise na transição histórica explicada, não se consegue
constituir uma moralidade convincente e, acima de tudo, absoluta, que norteie
as práticas político-sociais, enquanto que “nos velhos tempos todos sabiam o
que era bom e certo” (HELLER,
1998, p.113).
Na modernidade, toda
discussão moral é válida e, ao mesmo tempo, relativa, vazia, ignorada e ainda
assim norteadora, dependendo do poder político vigente. A moralidade, por
conseguinte a ética, na modernidade não possuem base ou parâmetros, vivendo um
verdadeiro paradoxo, conflito e contradições internas nos pensamentos e
paradigmas que a fundamentam e a constroem. Pois, usamos termos morais
várias vezes sem nos damos conta do seu real significado e, cada vez mais, estamos
nos distanciados dos antigos conceitos sobre fins morais, das virtudes
perfeitas e do princípio que acreditava na natureza humana como passível de ser
moldada até chegar ao ponto satisfatório de “bem”.
3
O
PARADOXO DE LIBERDADE
Para demonstramos e em seguida confrontarmos o Paradoxo que a modernidade expõe, são necessários entrecruzar os diversos conceitos e teorias tanto antigas quanto modernas, transportando-as a este último universo (modernidade) onde as discussões, conflitos e origem do paradoxo da liberdade realiza sua existência contraditória. Segundo a autora, o homem moderno insatisfeito necessita, tem sede de conhecimento, riqueza e poder, transgredindo as normas tradicionais, pois seu ideal de liberdade não está contido nos limites da norma: O moderno ideal de liberdade é inseparável do desejo.
“Tal conhecimento
consensual de objetivo moral, confirma ele, está agora ausente e, cada discussão
de ‘natureza humana’ e seu potencial moral é, portanto, sem significado”
(HELLER,
1998, p.114). Hegel centraliza o entendimento do conceito ético-político
de justiça em uma compreensão sociopolítica. Seu conceito é mais abrangente,
podendo ser considerado como um aviso contra o formalismo.[11] Porém, de acordo com
Agnes a positividade do pensamento pouco pode oferecer; mesmo uma pequena
contribuição é problemática.
Outro ponto importante na construção do conceito é a
relação entre Rousseau e Hobbes, pois há dois horizontes diferentes de único
mesmo objeto[12]. De acordo com Rousseau, as Leis devem ser estabelecidas segundo as regulamentações às
vontades gerais, de todos para todos, portanto, é possível ser livre e ainda
assim estar sujeito às Leis, que significam as vontades desse ser livre[13].
Já em Hobbes, as Leis são incompatíveis com a liberdade, pois estas devem
limitar certos direitos dos homens a fim de estabelecer a paz, e, portanto,
limitam suas liberdades.
Hegel
lembra que a defesa da liberdade não passava pela crença liberal da redução do
Estado a simples ator responsável pela segurança pessoal, assim como pela
garantia das propriedades e contratos. Ao contrário, era necessário um ator
social capaz de limitar as tendências paradoxais das sociedades civis de livre
mercado, quebrando o puro interesse dos particulares. Ressaltando, Rousseau não
desafiou Hegel, ele readequou o modelo familiar de A nova Heloísa, isto é, de acordo com a obra, Rousseau evidência a
ideia que só se alcança a liberdade por meio de um esforço supra-humano,
de vencer o maior dos desafios: o próprio eu, e de abraçar o maior de todos os
bens: a virtude.
As
noções de liberdade e virtude devem ser interpretadas separadamente, por causa
da vaidade humana. Já que a própria razão pode ser corrompida, significa que o
progresso da razão humana não melhora o homem. Para isso é necessária haver uma
diferenciação entre o “desejo geral” e o “desejo de cada um”. Não é uma questão
de ensinar o que é justiça.
O homem, por sua natureza e
espírito de liberdade vive em constante conflito. O conflito por sua vez é uma
das provas de que um indivíduo é livre para escolher. Assim, percebemos que o
conflito é e sempre será inevitável nas relações humanas, uma
forma de justiça que se forma na moderna crença individual de liberdade acima
de um “bem maior”. É esse o ritmo do Paradoxo moderno: a modernidade como
tempos que se acredita no indivíduo essencialmente como continente da virtude e
da liberdade e que vive em conflito com o conceito ético-político de justiça.
Homens dominam
outros homens e é assim que nasce a diferença de valores; classes dominam
classes e é assim que nasce a idéia de liberdade; homens se apoderam de coisas
das quais eles têm necessidade para viver, eles lhes impõem uma duração que
elas não têm, ou elas as assimilam pela força – e é o nascimento da lógica
(FOUCALT, 2009, p.24-25).
Os paradigmas, neste
contexto moderno, realmente acreditam no “homem livre”, muito embora seja
muitas vezes essa liberdade, vazia. Tal paradoxo expõe a questão persistente
entre a subjetiva e a objetiva justiça, entre a consciência individual e a
legislativa, entre o real desejo intrasubjetivo e o intersubjetivo. Aparentemente
há uma necessidade de “forçar” a ideia de que o homem moderno é livre, em nome
de uma crença, o que é em si próprio um imenso paradoxo.
O conceito
ético-político que nasceu na Antiguidade não abraçou uma liberdade volátil,
como o faz a modernidade, e conseguia ser suficientemente objetivo. Na passagem
de paradigmas, dissolveu-se o conceito ético-político que, para sê-lo
verdadeiramente, necessita ser objetivado, inclusive para deixar de ser contraditório
como modernamente. É válido observar que:
(...) devido à
troca nos valores, o paradoxo da razão está se tornando o paradoxo da
liberdade. Platão não se empenhou em apresentar um estado onde a liberdade de
todos fosse garantida; nada se mostrou tão remoto na mentalidade grega. No
entanto foi exatamente essa a opção de Rousseau, com a qual ele se comprometeu;
e que os homens precisam ser forçados a ser livres, foi o paradoxo no qual
resultou o projeto (HELLER, 1998, p. 127).
Rousseau também se posiciona sobre a liberdade e a virtuosidade no
romance A nova Heloísa, último ponto a
ser tratado a fim de cumprir o objetivo inicial. Heller é clara: “O romance
trata da pluralidade de atitudes
certas” (HELLER.
1998 p. 121), embora a palavra
“pluralidade” exprima conjunto, pode isto assumir duas significações: a
primeira é que as atitudes certas são reuniões sobre um único princípio; a
segunda se refere à reunião de várias atitudes certas de naturezas e princípios
diversos. Para explicar o entendimento de Rousseau, precisa-se tomar a segunda
concepção.
Os personagens, de A nova Heloísa
não se conduzem a “atos viciosos” porque permanecem em rede, mesmo não
possuindo ou admirando (visando) uma moral comum: “Apenas alguns poucos valores
são partilhados por todos os membros do círculo. Entretanto, esses valores
partilhados se originam da pluralidade de valores e dela dependem” (HELLER. 1998,
p. 121). Desse modo, o próprio
Rousseau expressa a pluralização e de certa forma a relativização da
moralidade, na qual à rede voluntária, de atos individuais, é acreditada a
sobrevivência do sistema.
A nova Heloísa simboliza a contradição maior do paradoxo da
liberdade: Na modernidade o Poder, que restringe e sobrepuja a liberdade, é
valorizado, ao mesmo tempo em que a virtude e moralidade são individualizadas;
é evidente a contradição, convivem em conflito os interesses de desejo de cada
um e o desejo geral, a liberdade e a sua limitação.
4 ORDEM LEGAL MODERNA VERSUS A JUSTIÇA ÉTICO-POLÍTICA
A modernidade construiu uma base racionalista de política, mas que
mediante a dissolução do conceito ético-político de justiça, erigiu um Estado
com o pragmatismo do poder soberano: O Estado Moderno. Pensou-se mais na
forma-estrutural do que no conteúdo ético, que deve “animar” e nortear a
justiça na execução do poder. É em interferência a este fato que Agnes Heller
elabora um olhar critico a sua abordagem sobre consciência legislativa, não com
uma carga individual (o que se mostrou ineficiente), mas com teor ético na
formulação legal da ordem[14]:
uma vez que a má consciência tem recurso ao divino julgamento, e a consciência
cética se restringe a um conceito ético de justiça, é apenas a consciência
legislativa que estabelece novas formas de conceito ético político de justiça” (HELLER.
1998, p. 115).
O que ela propõe é uma forma concreta da ordem construir o “bem” por
meio de uma consciência legislativa através da razão e tendo como objeto a
“natureza humana”. Entretanto, a raiz da razão prática se mostra arraigada na
modernidade de tal modo que interessa mais à própria ordem política “existir”
do que “viver”; ética e moralmente, o poder acima da moralidade: “A moderna
razão prática e a consciência [não se trata de uma consciência legislativa]
tornam-se o árbitro final com relação ao bem e ao mal” (HELLER, 1998, p. 115). Portanto,
o “ideal” pensado pela autora não concretizado materialmente na modernidade,
expõe o sintoma da dissolução do conceito ético-político.
Hobbes como teórico do Estado Moderno é expressão desse pragmatismo político,
no qual se acredita que a ética do homem como interesse e conveniência (o
vantajoso) para a devida manutenção da ordem social. É nítido que podemos
considerar Hobbes como sendo a grande expressão da razão prática, onde o
aspecto mais importa a é ordem e as seguranças traduzidas no poder da
metafórica figura do “Leviatã”. Heller faz fortes críticas a essa razão prática,
pois ela considera um fator que obscurece o claro entendimento da
ética-política: “uma vez que a razão é portadora de ‘leis da natureza’, a boa
razão prática é, por assim dizer, natural para Hobbes” (HELLER, 1998, p. 119).
“O desejo geral tornou-se um ‘imperativo categórico’ externalizado e
alienado, a concretização da ‘consciência alienada’” (HELLER. 1998,
p. 126). Podemos citar como exemplo desse pragmatismo a
Inglaterra moderna, citada pela autora, na qual a tendência sócio-política do
conceito ético político de justiça subordinou as essências de benevolência e
moralidade, sobressai-se a ordem legal política, e da justiça resta meramente a
“distributiva” e “retributiva”. Desse modo, o modelo hodierno que vige na
modernidade engessou a vontade pelo justo, ao mesmo tempo em que valoriza meios
constrangedores, em detrimento da construção de um caráter e de um sentimento
pelo justo.
5
A
“CIDADE DA ALMA” RECONSIDERADA
As
reconsiderações feitas no conceito ético-politico de justiça foram extremamente
prejudiciais, ou seja, a partir do momento que a essência é dividida em dois
rumos: a filosofia da moralidade e o conceito sociopolítico de justiça, o
decorrer do processo de construção do entendimento é alterado. Suscita um
aspecto negativo, visto que, não se pode dividir em partes distintas sem
prejuízo a sua significação, já que não podemos dividir um conceito em dois sem
que haja danos na construção do pensamento.
Na
tentativa de garantir o direito, o conceito sociopolítico de justiça deixou de
lado as preocupações morais com o melhor mundo possível e passou a ditar
recomendações. Caminhando para perspectivas de distribuição e retribuição
centralizadas principalmente no problema: há uma “distribuição justa”? As
ideias de laissezfaire foram substituídas
pela “vida boa”. Consequentemente a ideia de justiça remete ao imparcial,
contudo, implica em uma característica moral de aprovação e desaprovação.[15]
Segundo Kant a moralidade dos atos humanos está em fazer o uso da
liberdade. Quando não há liberdade para escolher e agir, não se pode atribuir
valor moral à ação. Para que o ato possua valor moral o indivíduo não pode ser
coagido, ou impulsionado a agir de determinada maneira, que não seja próprio
dele. Portanto, agir racionalmente por dever e obedecer às leis são garantir a
liberdade[16].
A liberdade é um pressuposto básico para que o
homem seja responsável por seus atos e suas escolhas; o período moderno é
chamado também de período antropocêntrico, onde o homem é capaz de fazer suas
escolhas e praticar suas ações, e é neste período que lhe é oferecido a
possibilidade de emancipar-se e ser autônomo.
5.1
A FALSA RECONCILIAÇÃO DA CIDADE-DA-ALMA
Cidade-da-alma é um dos
três elementos fundamentais[17]
para a fundamentação do conceito ético-político em Hegel, autor ao qual Heller
faz uso para embasar seu discurso de justiça. Em seu capítulo “A
‘cidade-da-alma’ reconsiderada”, ela trata de como a modernidade esboçou um
esforço em superar um conceito meramente idealista e individualista,
reconciliando-o com o entendimento concreto da realidade, na tentativa de
confluir para um mesmo ponto o ser e
o dever-ser.
Hegel não nega ser
moderno, pois trata “a realização da liberdade de todos como liberdade ótima” (HELLER. 1998, p. 128-129),
mas ainda assim consegue aspirar a um conceito de certeza (espírito objetivo). Ao assumir essa postura, busca ele
ascender a um conceito ético-político de justiça real e completo, ao qual a
certeza mostra-se fundamental. Real porque se situa no “mundo de hábitos”, e
completo, pois, relacionam as “três cidades” ao espírito objetivo e à
subjetividade. No qual concentra no homem as certezas da “sua obediência às leis de ‘boa cidade’ e a motivação
moral da pura consciência como liberdade máxima” (HELLER. 1998, p. 129).
Desse modo, o maior mérito de Hegel foi a “Reconciliação com a realidade”,
projeto que embora tenha se mostrado uma “promessa de resposta” ao idealismo
moderno, acabou por embarcar também nesse mesmo caminho. A dita reconciliação
é, na verdade, uma “falsa reconciliação”.
A mencionada
reconsideração significa rever alguns valores básicos que se encontram na
modernidade. A proposta de Agnes Heller é a reconciliação do “Bem moral” com o
“Bem natural. Desse modo, a moralidade não se torna submetida à “ordem legal”,
tampouco será (em teoria) arbitrária, mas continua a ser universal (geral na
modernidade), em teoria, sem correr o risco de ser relativizada. Porém como
isso se realiza? É a falta de resposta a essa pergunta que impossibilita a
reconciliação
Hutcheson[18]tentou
fornece as bases para fundamentar a reconciliação da “cidade-da-alma” com a
realidade, mas é ele também responsável pela forma mais visível da já mencionada
“falsa reconciliação". Seus ideais recaem num erro de redundância de uma
filosofia das intenções difícil de ser demonstrada, pois a percepção das
intenções não se mostra suficientemente objetivada, principalmente por ser este
um “requisito” fundamental do conceito ético-político. As reconsiderações
feitas no conceito ético-politico de justiça foram extremamente prejudiciais
A cidade da alma
reconsiderada é um abismo, a solução proposta por Hutcheson parece perfeita,
mas é nada mais que especulação excessiva da “personalidade ética” pouco
concreta. Definitivamente, o conceito ético-político de justiça se dissolve e
se mostra insuficiente, para se crer na veridicidade de tal conceito, tomar
como fundamento prioritário a metáfora de Fausto, que se reconcilia com a
ética-política mediante a impossibilidade de experimentação de outros desejos.
5.2
POR QUE "ALÉM DA
JUSTIÇA"?
Meu conceito ético-politico de justiça
segue os passos de uma tendência do iluminismo. Ele se reflete na especifica
condição humana de modernidade, estando consciente das possibilidades e limites
da condição humana em geral. Ele é normativamente baseado na generalização da
“regra de ouro”, pela máxima universal de justiça dinâmica, e pelos valores
universais de vida e liberdade.
(HELLER, 1998, p. 433)
Para
a autora, o objetivo da justiça está além da justiça: A questão de justiça é
muito abrangente não podendo ser considerada de acordo com único aspecto ou
regra determinada. Mas não podemos ir além da condição humana. Heller propõe um
ideal de boa vida para um melhor socialmente possível sem esquecer as diversidades
dos indivíduos, por isso, seu principal questionamento é a existência ou não de
um conceito de justiça, que acompanhe todas as transformações políticas, éticas
e socais que possibilite uma sociedade boa e harmônica.
Ao
decorrer da obra, ela vai relacionando inúmeras correntes teóricas para tentar
uma conceituação mais abrangente. Embora, as relações de poder acabam por
restringir em nosso eu, mas isso não significa que toda forma de poder seja maléfica.
Ele enfraquece as relações quando ligado a uma natureza dominante, porém, nem
toda forma de poder sócio-político é equivalente a uma forma de dominação.
Neste
contexto, as complexas relações de poderes de dominação e humanitários
demonstra a existência de cada conceito ético-político de justiça incompleto
com todas as suas contradições. Segundo a autora, a bondade está bem além da
justiça. Uma vez que a justiça sempre vem acompanhada de carga moral, a bondade
de uma pessoa não envolve somente a virtude de justiça mais o exercício desta
virtude. Essa é concepção básica para o entendimento do conceito ético-politico
incompleto de justiça discutindo nesta obra. Isto é, segue os passos de uma
tendência do iluminismo.
Heller
demonstra para que haja o melhor mundo sociopolítico possível é necessário o
respeito ao universo diversificado, isto é, aonde as normas e regras sejam
ajustadas pelo procedimento justo, considerando as condições da vida boa de
todos. Entretanto, a própria vida boa está além da justiça. Não simplesmente
uma opção de atos ou escolhas únicas. Não obstante, devemos questionar a ideia
de pessoa justa.[19]
Ressaltando,
nem todos os conceitos de justiça implicam em um conceito político de justiça;
A boa vida tem como eixos principais: a honestidade (bondade), o nosso melhor
dom e as forças que emergem de nossas relações pessoais e sendo assim temos a
vida boa como além da justiça. Para Agnes, esses três aspectos são fundamentais
para que se tenha a oportunidade de vida igual para todos, liberdade igual para
todos sendo o objetivo do melhor mundo sociopolítico possível e merece ser
buscado, pois, é a condição existente para a possibilidade de vida boa a todos
sem distinção. É fato que de acordo com o contexto destas três constituintes
variam.
CONCLUSÃO
No livro “Além da Justiça”,
Heller primeiramente propõe uma redefinição do conceito formal de justiça, dizendo que ele significa
a aplicação consistente e contínua das mesmas normas e regras a cada um dos
membros de um agrupamento social, ou seja, aos quais elas se aplicam, a autora
utiliza os termos normas e regras em conjunto, uma vez que considera errado
garantir que todos os regulamentos sociais assumam um caráter de regra, mesmo
se isso for amplamente usado na sociologia ou na filosofia moderna, outro
aspecto é que as regras podem ser seguidas apenas de uma forma única e
definitiva, enquanto as normas são diferentes por sua natureza, porque existem
normas concretas e abstratas.
Ao confrontar justiça formal
(estática) e julgamento, diz que, do ponto de vista de justiça estática, o
julgamento é feito por mérito ou competência e seus respectivos opostos. Exceto
quando mantemos nosso julgamento para nós mesmos, todos os julgamentos são
ações. São manifestações de discurso e com frequência incluem atos outros que
não manifestações de discurso.
A autora considera a
modernidade como um dissolvente do conceito ético-político de justiça, há muito
construído, ela passa a ser
compreendida como esvaziada de seu conteúdo ético, é o império da razão assume a função de “juiz” e dita nosso entendimento
sobre o bem e o mal, pois, nem todos os conceitos de justiça
implicam em um conceito político de justiça. Não obstante temos, também, que as
reconsiderações feitas no conceito ético-político de justiça foram extremamente
prejudiciais, ou seja, a partir do momento que a sua essência é dividida em
dois rumos, pois suscita um aspecto negativo, visto que, não se pode dividir em
partes distintas sem prejuízo a sua significação.
A questão da justiça, do que é justo ou injusto, abrange não somente uma regra
determinada é variável, tanto quanto o caráter humano. O
objetivo da justiça está além da justiça, porém é nítido que não podemos ir além
da condição humana, mas para que haja o melhor mundo sociopolítico possível é
necessário o respeito ao universo diversificado, isto é, as normas e regras
sejam ajustadas pelo procedimento justo, considerando as condições da vida boa
de todos. Entretanto, a própria vida boa está além da justiça, e a bondade está
muito além da justiça uma vez que a justiça sempre vem acompanhada de carga
moral, a bondade de uma pessoa não envolve somente a virtude de justiça mais o
exercício desta virtude.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES.
Livro I. In. Ética a Nicômaco. Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2007,
p. 37-65.
_____________. Livro V. In. Ética a Nicômaco. Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2007, p. 145-176.
ALMEIDA,
Guilherme Assis De; BITTAR, Eduardo C.B. Curso
de Filosofia do direito. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010.
BITTAR, Eduardo. Curso de ética jurídica: ética geral e
profissional. 10 Ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 25-95.
COSTA,
Edgar Rogério. A virtude e a felicidade na Nova Heloísa de Rousseau. Unicamp.
Disponível em: <http://edgarrogerio.net/arquivos/heloisa.pdf>. Acesso em:
10 de setembro de 2013
FECCIHIO, Mariceles Cristhina.
O conceito de justiça Agnes Heller. Revista
Democracia Digital e Governo Eletrônico, 2011. Disponível em:<http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/o-conceito-de-justi%C3%A7a-agnes-heller>
Acesso em 10 de setembro de 2013.
FOUCAULT, M. Microfísica do poder, Graal, RJ, 2009.
HELLER, Agnes. A dissolução do conceito ético-político de
justiça na modernidade. In. Além
da Justiça. Tradução Savannah Hartmann. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1998, p. 111-144.
KANT, Immanuel. Primeiros princípios metafísicos da doutrina
do direito. In. WEFFORT, Francisco C. (Org.). Os clássicos da política (vol.2). 10. Ed. São Paulo: Editora Ática.
2001, p. 72-83.
PAIM, A. O
Dicionário de Obras Básicas da Cultura Ocidental. Vide editorial. Disponível em: http://www.videeditorial.com.br/dicionario-obras-basicas-da-cultura-ocidental/f-g-h-i/fenomenologia-do-espirito-de-hegel.html. Acesso em: 14 de setembro de 2013
[1]Trabalho apresentado como
requisito avaliativo da disciplina a de Ética Jurídica, ministrada pelo Prof.
Dr. Luiz Otavio Pereira, tendo como texto base a bibliografia: HELLER, Agnes. A
dissolução do conceito ético-político de justiça na modernidade. In. Além da Justiça.
Tradução Savannah Hartmann. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998, p.
111-144.
[2]Discente do Curso de Direito da Universidade
Federal do Pará. Matrícula 13641001801
[3]Discente do Curso de Direito da
Universidade Federal do Pará. Matrícula 11015014201
[4]Discente do Curso de Direito da
Universidade Federal do Pará. Matrícula 13641003801
[5]Bittar (2007) A justiça funciona, como um valor que norteia a
construção histórica-dialética dos direitos, para expectativas sociais em torno
do Direito. Apesar de a justiça possuir uma complexa definição.
[6]A questão da justiça, do que é justo ou injusto, abrange não
somente uma regra determinada é variável tanto quanto o caráter humano.
[7]Com a mudança nos métodos de
reflexão do objeto de estudo temos uma nova perspectiva de análise
consequentemente haverá uma nova forma de conceituar surge neste conceito uma
nova visão dos paradigmas. Uma virada no dogmatismo é proposta pela Autora.
[8]Ao comentar o conceito de
felicidade ela evidencia a ideia de liberdade. Agnes Heller (1998, p.79) apresenta em sua obra que: “A
idéia de que os bons devem ser felizes porque merecem a felicidade e que os
maus devem ser infelizes porque não a merecem é à base do conceito ético de
justiça”, contudo, nem todos os conceitos éticos de justiça implicam um conceito
político de justiça.
[9] Aristóteles (2007) ao discutir
tanto o conceito de justiça como a sua realização, menciona dois tipos de
justiça: uma Justiça Natural e outra Justiça convencional, e em outros momentos
conflita Justiça legal e Justiça em um sentido primordial. Podemos concluir que
embora na pólis (aqui como representação da ordem política) haja um regulamento
formal, a justiça na visão antiga é mais abrangente do que isto.
[10]Heller relaciona os conceitos
éticos e políticos para tentar uma conceituação mais abrangente.
[11]A Fenomenologia
do espírito contém a gnoseologia hegeliana. Na tradição desses estudos,
iniciada por Locke, todo o conhecimento provém da experiência sensível. No
nível inicial desta temos separadamente as sensações e a percepção, seguindo-se
a representação. Depois se passa ao plano das idéias onde a grande preocupação
é identificar as idéias simples, que estariam mais próximas da experiência
sensível inicial. Hume unificou os momentos da sensação e da percepção, chamando-os
de impressões primeiras. Disponível em:http://www.videeditorial.com.br/dicionario-obras-basicas-da-cultura-ocidental/f-g-h-i/fenomenologia-do-espirito-de-hegel.html. Acesso em: 14 de setembro de
2013
[12] Rousseau se baseou no Leviatã de
Hobbes para compor seus argumentos no Contrato Social, e concorda com ele
quanto à única possível e verdadeira justiça: a divina. Não há questionamento
sobre a existência de Deus, porém se questiona os pactos que se fazem através
ou em nome Dele. O estado de natureza de Hobbes e o
estado de sociedade de Rousseau evidenciam uma percepção do social como luta
entre fracos e fortes, vigorando a lei da selva ou o poder da força. Para fazer
cessar esse estado de vida ameaçador e ameaçado, os humanos decidem passar à
sociedade civil, isto é, ao Estado Civil, criando o poder político e as leis.
[13]Kant (2001) também discorre a
respeito da liberdade em concílio com o ordenamento e com as leis, o que se
chamou sociedade civil, na qual a liberdade não é tratada como limitação ao
poder, mas distinguindo-se de uma liberdade natural, na observação das leis é
realizada a verdadeira forma de liberdade em sociedade.
[14] Para Agnes Heller, a ótica
ético-política não pode ser passiva diante da ordem político-legal, mas sim tem
que estruturá-la através da consciência legislativa.
[15]
Na conjectura moderna generalidade é universalidade para a autora.
[17]Os três elementos são:
Cidade-da-alma, Cidade-da-terra e Cidade-do-céu; são importantes, sobretudo,
por representarem a harmonia entre conceitos metafísicos e materialistas.
[18] As considerações sobre o Autor
são baseadas naquelas mencionadas em: HELLER. 1998, p. 139-141.
[19]Honesto está com sentido de
bondade e certeza.
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